Algumas vezes me sinto
fora do mundo. Parece que estou no mundo, mas não faço parte dele. Esforço-me
para construir uma linguagem para que o outro me entenda. Quando o outro
consegue, sou eu quem não acredita naquilo que eu próprio disse, porque parece
faltar um pedaço para um entendimento completo.
Como professor, aprendi
a ser didático. A didática é uma metodologia, um caminho para que os outros
consigam chegar a um conhecimento comum. Então, a maneira que busco as palavras
possui uma organização. Quando conheci a teoria de Edgar Morin sobre a
complexidade, me perdi novamente. Segundo ele, o pensamento complexo religa o
que o pensamento disciplinar disjuntou e parcelarizou. A palavra complexus significa “O que é tecido em
conjunto”. Portanto, nada está separado. O que nos falta é o olhar para ver as
coisas entrelaçadas.
O pensamento complexo
tem muito a ver com a física quântica. Por exemplo, o emaranhamento quântico é um fenômeno da física
quântica que permite que dois ou
mais objetos estejam de alguma forma tão ligados que um objeto não possa ser
corretamente descrito sem que a sua contraparte seja mencionada - mesmo que os
objetos possam estar espacialmente separados. Isso leva a correlações muito
fortes entre as propriedades físicas observáveis dos diversos subsistemas.
Não é fácil pensar assim, porque o
nosso pensamento é linear, reforçado pela física newtoniana. Sendo assim, não
conseguimos entender facilmente o que uma coisa tem a ver com a outra. Principalmente
se elas tiverem características muito diferentes.
Trazer essa maneira de pensar para o
nosso cotidiano nos ajuda muito. Eu, por exemplo, melhorei bastante quando
comecei a ver o mundo como uma colcha de retalhos que formam um todo
organizado. É preciso prática, um exercício do olhar. Quando nos afastamos da
situação local para vê-la por uma perspectiva geral, alcançamos um entendimento
mais plácido dos acontecimentos. Se não estivermos satisfeitos, mesmo assim,
então é só esperar, pois nós mudamos. Como escrevi no livro “Quem somos nós? O
enigma do corpo”:
“Se acreditarmos na mudança, veremos que não existe o erro, nem tampouco a possibilidade de errar. Tudo está certo nos espaços retos e curvos da vida. Assim sendo, o corpo não é, em hipótese alguma, uma estrutura estática insolúvel. Pelo contrário, é plástico, com dinamismo de mudança em todos os momentos. Nunca se apresentará sólido e imutável, sempre se modificará, dependendo da experiência que tiver. É na dinâmica do corpo que está a chave do entendimento dos caminhos escolhidos, das diversas lições aprendidas. O corpo é o portal. Conhecê-lo é estar mais próximo daquilo que chamamos sabedoria.”
Ontem estive no
hospital até três horas da manhã. Um familiar se acidentou. Eu conheço a
história dele, e, penso que o acidente não foi em vão. Não existem acidentes ao
acaso. Todas as pessoas que sofrem um acidente possuem uma motivação
inconsciente. O que fica claro para mim, na história dele, é que ele teve a
parada necessária. Estava sem freio há muito tempo. Agora, não há movimento. Ele
terá de ressignificar sua vida. Não sei o que acontecerá, mas a mudança será
marcante, não tenho dúvida.
Se todos os
acontecimentos são individuais, como experiência, e coletivos, como percepção,
fica bem mais complicado saber juntar as peças. Só quem pode juntá-las é quem
as sofre. Por isso, crio resistências ao construir uma resposta.
Nessa semana fiz uma
pré-entrevista para um programa da Rede Globo. Achei interessante, pois a
produtora precisava saber se eu estava apto para participar do programa. Uma
espécie de pré-vestibular midiático. Conversamos durante uma hora e meia. Ela ficou
intrigada com as minhas respostas, e, muitas vezes, perdida em minha maneira de
pensar. Mas, era uma mulher inteligente, queria saber mais. Senti que ficou
envolvida, como eu também. De repente, ela voltou ao padrão de todo repórter. Ela
me pediu para dar dicas sobre como envelhecer bem. Pronto. Nesse momento entrei
em minhas resistências sobre dizer para o outro o que deve ser feito. Não acredito
que seja assim. Ninguém pode dizer ao outro o que se deve ou não fazer. A escolha
é individual, baseada em toda a história de vida.
Eu disse a ela que eu
poderia dar apenas uma dica. As outras seriam consequências da primeira. Para envelhecermos bem temos de exercitar a
nossa REFLEXÃO. A palavra chave para um viver bem e, consequentemente,
envelhecer bem, é saber o que a vida mostra. Tudo parte de nós e termina em
nós. Os acontecimentos da vida nos mostram a nós mesmos, como um espelho a
refletir nossa imagem. Para sermos maduros precisamos ser responsáveis por
nós. A partir do momento que conseguirmos assumir a nós mesmos, sem maquiagens,
veremos que somos o que vivemos.
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