Essa semana eu vacilei e caí na
dúvida. Ao entrar nesse espaço me vi assustado, com medo do irreal, de nada ter
importância, de sentir o que pode não ser a minha verdade. A dúvida não é salutar,
indica caminhos dúbios e, mesmo assim, sem nenhuma direção. Ao me fragilizar me
senti amedrontado. Os meus pensamentos foram à beira do abismo e o corpo em
resposta se retesou, o sistema imunológico despencou e o rotavírus que passava
por perto se alojou em meu organismo. Fiquei quatro dias sem ação, experimentando
uma sensação desagradável, desconfortável, o que me gerou mais dúvida ainda. Perdi
a mim mesmo no meu espaço-tempo construído.
Estar doente é um estado de estranheza,
um lugar no qual nos sentimos menos conscientes de nós mesmos, um lugar sem
configurações claras. Não adianta tentar sair, é necessário ser humilde e
esperar a nova organização. Um corpo doente está sempre em processo de reorganização.
O que eu temia era qual seria a nova organização, pois sei que nem sempre o
novo é melhor. Ninguém pode saber como o corpo se apresentará depois de uma
transformação.
Por que me fragilizei? Não sei
responder. Sei que existem forças a me mover em sentidos desconhecidos. Não
queria entrar na resistência de entender o significado do mal-estar, mas não era
fácil para mim. Trabalho com a compreensão dos sintomas corporais como método
de autoconhecimento, como eu poderia deixar de pensar no que eu sentia? Só
que eu estava sozinho, e nessa situação não sabia como me conduzir, é
necessário o outro para dar a mão. Os terapeutas servem para isso, eles
auxiliam na condução da embarcação enquanto o doente não consegue enxergar
através das brumas de si mesmo.
Sei que nem tudo precisa
entendimento, pois saber pode significar interpretar, criar um modelo, uma
justificativa. A razão prega peças, ela incita manipulações da verdade. Queria entender
para me sentir em segurança, no controle da situação, não podia perder o poder que
o meu conhecimento representa para mim. Sei que a doença se manifesta para nos
colocar em outro estado, com uma nova forma de conduta. As criações da razão
não nos levam a lugar algum nesses momentos. É preciso confiança na mudança, na
sabedoria do corpo, confiar no tempo próprio do organismo. Mesmo sabendo disso não
deixei de querer controlar, pois o “meu” tempo de recuperação se prolongava. A
preocupação é também um modo de controle. Queria compreender o que estava
acontecendo para sair logo do incômodo.
Sintoma
significa literalmente “juntar os pedaços”, analisar
quer dizer “separar” para entender melhor. Por isso, analisar não é a melhor metodologia
no momento em que estamos nos sentindo mal.
O meu espaço-tempo se contraiu mais
ainda quando a febre alta me fez contorcer em calafrios. As fortes dores pelo
corpo se manifestavam ao tentar me aproximar de mim mesmo para entender. Eu fui
sendo afastado de minhas convicções, de minhas incertas certezas. Pude sentir a
resistência tomar conta dos meus músculos tensos. O medo prejudicava o meu
equilíbrio e coordenação. Tive a intenção de me abandonar, mas o enjoo me
trazia de volta. Queria ficar imóvel, mas a diarreia me direcionava a todo o
momento ao banheiro. Não tinha sossego. Tinha de me levantar da cama e sentir o
corpo vacilar inúmeras vezes.
Finalmente me recuperei, e agora carrego
em mim a lembrança do sentimento de impotência. Uma impotência saudável na qual
me direciona a outra margem, não posso afirmar se estou melhor por isso. A única
coisa que sei é que não importa a trajetória, é importante saber que não existem
regras. O que acontece tem de acontecer. Aprendi sim a ser mais humilde comigo
mesmo, como a terra molhada após um dia de muito calor.
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