19 de janeiro de 2013

Dúvida e Rotavírus





Essa semana eu vacilei e caí na dúvida. Ao entrar nesse espaço me vi assustado, com medo do irreal, de nada ter importância, de sentir o que pode não ser a minha verdade. A dúvida não é salutar, indica caminhos dúbios e, mesmo assim, sem nenhuma direção. Ao me fragilizar me senti amedrontado. Os meus pensamentos foram à beira do abismo e o corpo em resposta se retesou, o sistema imunológico despencou e o rotavírus que passava por perto se alojou em meu organismo. Fiquei quatro dias sem ação, experimentando uma sensação desagradável, desconfortável, o que me gerou mais dúvida ainda. Perdi a mim mesmo no meu espaço-tempo construído.

Estar doente é um estado de estranheza, um lugar no qual nos sentimos menos conscientes de nós mesmos, um lugar sem configurações claras. Não adianta tentar sair, é necessário ser humilde e esperar a nova organização. Um corpo doente está sempre em processo de reorganização. O que eu temia era qual seria a nova organização, pois sei que nem sempre o novo é melhor. Ninguém pode saber como o corpo se apresentará depois de uma transformação.  
  
Por que me fragilizei? Não sei responder. Sei que existem forças a me mover em sentidos desconhecidos. Não queria entrar na resistência de entender o significado do mal-estar, mas não era fácil para mim. Trabalho com a compreensão dos sintomas corporais como método de autoconhecimento, como eu poderia deixar de pensar no que eu sentia? Só que eu estava sozinho, e nessa situação não sabia como me conduzir, é necessário o outro para dar a mão. Os terapeutas servem para isso, eles auxiliam na condução da embarcação enquanto o doente não consegue enxergar através das brumas de si mesmo.

Sei que nem tudo precisa entendimento, pois saber pode significar interpretar, criar um modelo, uma justificativa. A razão prega peças, ela incita manipulações da verdade. Queria entender para me sentir em segurança, no controle da situação, não podia perder o poder que o meu conhecimento representa para mim. Sei que a doença se manifesta para nos colocar em outro estado, com uma nova forma de conduta. As criações da razão não nos levam a lugar algum nesses momentos. É preciso confiança na mudança, na sabedoria do corpo, confiar no tempo próprio do organismo. Mesmo sabendo disso não deixei de querer controlar, pois o “meu” tempo de recuperação se prolongava. A preocupação é também um modo de controle. Queria compreender o que estava acontecendo para sair logo do incômodo.

Sintoma significa literalmente “juntar os pedaços”, analisar quer dizer “separar” para entender melhor. Por isso, analisar não é a melhor metodologia no momento em que estamos nos sentindo mal.

O meu espaço-tempo se contraiu mais ainda quando a febre alta me fez contorcer em calafrios. As fortes dores pelo corpo se manifestavam ao tentar me aproximar de mim mesmo para entender. Eu fui sendo afastado de minhas convicções, de minhas incertas certezas. Pude sentir a resistência tomar conta dos meus músculos tensos. O medo prejudicava o meu equilíbrio e coordenação. Tive a intenção de me abandonar, mas o enjoo me trazia de volta. Queria ficar imóvel, mas a diarreia me direcionava a todo o momento ao banheiro. Não tinha sossego. Tinha de me levantar da cama e sentir o corpo vacilar inúmeras vezes.
  
Finalmente me recuperei, e agora carrego em mim a lembrança do sentimento de impotência. Uma impotência saudável na qual me direciona a outra margem, não posso afirmar se estou melhor por isso. A única coisa que sei é que não importa a trajetória, é importante saber que não existem regras. O que acontece tem de acontecer. Aprendi sim a ser mais humilde comigo mesmo, como a terra molhada após um dia de muito calor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário