O problema da culpa
Sentir culpa é uma maneira de se autocriticar negativamente. A culpa sempre habita o passado, com sérias repercussões no presente. O cérebro não distingue o que já se passou e o que está se passando. A lembrança quando trazida ao presente é novamente vivenciada. Os dois hormônios descritos acima são novamente liberados, provocando no corpo a reação de defesa. O problema é desligar a reação, porque uma vez que ela é deflagrada constantemente, o cérebro se habitua. Sendo assim, ele não mais desliga a reação. A pessoa passa a viver constantemente em prontidão, e até mesmo sentir a falta se os níveis de hormônios caem. Esse é o caso dos viciados em estresse. Conheci um executivo que se sentia mal no fim de semana, ficava entediado, com fortes dores de cabeça e no peito. Ao chegar segunda-feira se sentia novamente bem, pronto para o trabalho.
Criticar o passado pela perspectiva do presente é improdutivo, injusto, incoerente. Você pode se lembrar de um acontecimento e pensar: “não deveria ter feito aquilo”, “como eu pude ser tão burro a ponto de confiar naquela pessoa?”, “por que eu não disse o que tinha para dizer?”, “se eu pudesse voltar ao passado viveria de outro modo.”.
Cada vez que uma pessoa traz uma lembrança à consciência presente provoca também uma emoção, uma energia em movimento que será expressa de algum modo. O único lugar que uma emoção pode ser expressada é no corpo, porque ele é o palco de manifestação de todas as ideias, sentimentos, lembranças. Por assim dizer, é na ação do presente, nos músculos respectivamente, que são depositadas as falhas e erros do passado, se assim escolhermos insistir na culpa.
É uma injustiça, um equívoco, criticar-nos com olhos do presente por não ter tido determinada atitude no passado. Envelhecemos e mudamos conceitos, aprendemos novos conhecimentos, trocamos posturas, criamos outros olhares. Na época passada éramos outros, não tínhamos outro jeito de ser. Culpar-nos é como exigir de uma criança uma responsabilidade que ela não pode ter. A autocrítica pesarosa com aquilo que já se passou é uma tentativa de autopunição. É como comer um bolo inteiro e depois enfiar a mão na garganta para vomitá-lo. É uma atitude de autoagressão. Muitas pessoas passam pela bulimia da intolerância sem compreender que elas estão se matando aos poucos, sem saber que o fazem.
E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem - Lucas 23:34
Da mesma maneira que algumas pessoas se culpam pelo passado, podem também se culpar pelo futuro. Antes mesmo que ele aconteça já se põe em julgamento, por acreditar que não serão capazes de fazer o melhor.
Vinte e dois anos atrás eu fui convidado a dar aula na universidade. Queria muito ser um bom professor, mas não tinha conhecimento, só vontade. Tive coragem em aceitar o cargo, me propondo, portanto, a me dedicar aos estudos o máximo que podia. Levei dez anos de vida acadêmica para me tornar o que denomino professor consciente. Não nasci educador, fui me transformando em um. Podemos nos tornar aquilo que desejamos, porém tem de haver compromisso e dedicação. Muitos querem um diploma, mas não querem se dedicar ao conhecimento. Isso não trará nada, porque para alcançarmos algo temos de nos dedicar. Tudo surge primeiro dentro para depois se manifestar fora. É como diz a afirmativa de que o mestre surge quando o discípulo está pronto, ou o serviço aparece quando o servidor está pronto. Primeiro, crie em você o cenário, para depois vê-lo manifestado no palco do cotidiano. Na época, se eu me autocriticasse negativamente teria abortado a missão, e hoje não estaria aqui com vocês contribuindo com o meu conhecimento. Vivemos para contribuir com o outro. Não vivemos, mas convivemos.
continua amanhã.
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