28 de junho de 2011

Cuidado com as crenças



De acordo com a física quântica só existe observado se houver observador. Essa teoria assemelha-se à teoria da neurociência, a qual preconiza não existir cópias fidedignas no cérebro daquilo que é observado no mundo fenomenal. Ou seja, é o sujeito quem constrói o que sente. O problema disso é ter pensamentos negativos.

Ontem estive em uma banca de monografia de pós-graduação que ocorreu exatamente isso. Ficou claro para mim que eu era somente um personagem na história da aluna. Quando li o trabalho dela, achei bom. Não vi nada que eu pudesse reprovar. Tinha alguns deslizes teóricos, mas nada que comprometesse sua aprovação.

A aluna não estava tensa, e começou dizendo que havia pensado a semana inteira em iniciar a apresentação com uma "performance teatral". Disse ela ter imaginado algo que surpreendesse a banca, pensou fazer uma leitura poética ou um texto de literatura, ou mesmo uma dança performática. Ela não parava de falar, e o tempo do relógio corria. Ela tinha apenas quinze minutos para a apresentação. E começou um discurso contra ela mesma, dizendo que ela era insignificante e estava feliz por estar ali para apresentar o tema que havia estudado. Não gostava de ler. Sabia de suas dificuldades na faculdade e quanto foi difícil para conseguir completar o curso.

Ela insistia em afirmar que se fosse reprovada tinha valido a pena, porque ela era ignorante, inferior, sem conhecimento para estar ali. Eu não acreditava no que ouvia. Sempre participo de bancas, mas nunca antes havia ouvido algo parecido. O tempo terminou e ela não apresentou o material. Só falou dela, da história difícil da adolescência, dos percalços para conseguir ingressar no curso de pós-graduação, as dificuldades financeiras, da infância pobre, e, sobretudo de suas incapacidades intelectuais.

Subitamente pressenti que o trabalho não havia sido escrito por ela, uma vez que ela mesma disse não ser capaz, e sim o orientador. Percebia que ela não tinha credenciais para passar, mas o que eu tinha lido não estava tão ruim assim.

Ela foi interrompida pelo orientador, e eu fui convocado a fazer minhas observações. Primeiro, disse que ela havia perdido a oportunidade de apresentar o tema, e que estava muito egocentrada, só falando dela. Segundo, que ela não deveria ter feito uma explanação tão negativa dela mesma e, portanto, precisava de ajuda terapêutica, ela concordou com a cabeça. Terceiro, eu faria uma pergunta sobre o trabalho, sendo oportuno para ela desenvolver o tema, uma vez que não tinha feito até então.

Ela começou a me responder, mas de repente a sua fala resvalou para a sua dificuldade pessoal, ao mesmo tempo em que elogiava a minha capacidade intelectual. E, infelizmente, foi discorrendo para o próprio infortúnio.

O outro professor da banca também deu chances para ela falar sobre o trabalho, mas ela só enaltecia os participantes da banca e o orientador enquanto diminuía a si mesma. Não disse nada sobre a monografia.

O tempo terminou. Chegou o momento de decidir a nota. O orientador quis reprová-la, o outro professor também. Eu levantei a questão se ela tinha escrito o trabalho, e ouvi um coro consensual que não, e, portanto, tinha de ser reprovada.

Eu me senti muito mal, pois não tinha certeza. A dúvida é terrível. Fiquei incomodado, mas não podia fazer nada. Havia pensado em dar uma nota sete, um cinco talvez. Os outros professores resolveram um quatro. Então, a aluna foi reprovada.

Ao dar a notícia à aluna, ela riu e disse: "Sabia que eu era incapaz. Eu vou melhorar".

Saí de lá me sentindo mal com aquilo. Não sabia ao certo o que pensar. Então, percebi que foi ela mesma quem se reprovou a fim de confirmar a crença de sua incapacidade. Com a reprovação ela poderia se sentir mal e dizer a todos de que a vida é difícil, como várias vezes ela falou em sua apresentação.

É importante tomar conta de nossos pensamentos e crenças. Ninguém constrói o nosso mundo, simplesmente convidamos outros para serem os personagens de nossa história. Se a vida estiver ruim, é fundamental observar se estamos criando o obstáculo, pois no fundo queremos afirmar que somos vencedores de nosso próprio destino. Só vencemos quando morremos. A morte será o ápice de nossa jornada. Enquanto estivermos na jornada devemos preparar o caminho. Se merecemos o melhor, por que não arrumá-lo com flores?        

Um comentário:

  1. Anônimo06:22

    Olá, PEdro!
    Que situação hein.
    Deve ser mesmo dificil assistir a tudo isso, e ter que tomar uma decisão em meio a dúvidas.
    Mas, pode ser que ela tenha mesmo feito o trabalho.
    Eu gosto muito de escrever, e muitas vezes encontro coisas que escrevi depois de anos e frequentemente me deparo com o pensamento.
    Nossa fui eu mesma quem escrevi isso ?
    Depois que li um poema," Não Sei Quantas Almas Tenho (Fernando Pessoa)".
    Me senti menos estranha com esses sentimentos.
    Voltando a aluna, espero que ela faça dessa reprovação uma alavanca para entender melhor o mecanismo da vida, e que possa chegar as mesmas conclusões que você meu amigo.
    Sempre um aprendizado ler seus escritos.
    Abraços

    Creusa

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