11 de setembro de 2011

O tempo é um só




           Desde muito cedo aprendemos a projetar o futuro, um tempo que não é ainda e que não sabemos se será. A incerteza é o que nos move e nos faz mudar. Só podemos ser alguém pela mudança. Envelhecer é mudar. Não importa a idade, estamos envelhecendo e nos transformando. No processo de envelhecer adquirimos acontecimentos, somamos experiências, formamos histórias. Somos o que somos porque tudo balança. Como dizia Montaigne: “O mundo não passa de uma balança perene. Todas as coisas nele balançam sem cessar”.   

Quando eu era criança fantasiava as mais belas paisagens e as melhores imagens para um tempo que ainda estava por vir. Por meio de brincadeiras já demonstrava o que eu me tornaria na vida adulta. Lembro-me de brincar de professor, montava sala de aula com caixas de fósforo representando as carteiras, e punha bonecos Playmobil, índios apaches, xerifes, super-heróis, perfilados em uma mesma classe. Na última fila ficavam os monstros, porque eles eram os bonecos maiores, não porque eles eram inferiores. Na minha brincadeira não havia distinções entre os alunos, porque eu ainda desconhecia as demarcações do diferente. Só quando cresci mais um pouco fui perceber que mesmo entre as crianças existem as regras da diferença. Um grupo nos enquadra em certas classes sociais. Fui rejeitado por parte de meus colegas porque eu era o mais pobre deles. Não podia ter os mesmos brinquedos. Então encontrei asilo entre os mais velhos. As brincadeiras não eram as mesmas. Eles gostavam mais das histórias do que das fantasias infantis. Eu gostei daquilo. Achava interessante o que eles me contavam. Sendo assim, me tornei parceiros deles, uma espécie de interlocutor mirim, com muitas questões sobre tudo.
          
          O tempo do passado já anunciava a minha trajetória futura. O porvir já se prefigurava lá atrás. Hoje, no tempo presente, percebo todas as linhas do tempo e teço a minha presença aqui e agora. Todos os acontecimentos foram fundamentais para eu ser o que sou. Para sermos inteiros nada pode ser descartado, nem mesmo o sofrimento. Sem dúvida, quando percebia que eu estava sendo rejeitado por não ter o que os meus colegas tinham, isso gerava sentimentos de revolta, incompreensão, tristeza e, consequentemente, emoção de raiva. Foram fatos marcantes porque até hoje consigo lembrar. O que não tem relevância cai no vazio do esquecimento. Atualmente, no entanto, sou grato aos meus colegas pela rejeição, pois assim aprendi o valor da inclusão. 

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