O outono é a estação
mais emocionante do ano. O céu resplandece um azul forte, o clima é ameno e
tocante, a copa das árvores ao longe se torna meditativa.
Hoje me emocionei ao
experimentar estar sob o céu. A imensidão de uma cor fulgurante sem nuvens, sem
ameaças de chuva, sem temeridade ao frio. Nesses dias, o sol deleitante carrega
a paz de um silêncio ocioso. Todavia, eu sabia que a minha emoção não era
somente do tempo presente. Existem lembranças sutis a se manifestarem em certos
dias do ano. É uma conjunção de tempos de outrora com o atual. Lamento não
conseguir me lembrar dos dias simples de todos os anos. Como eu gostaria de
saber mais sobre os meus tempos, saber o que aconteceu comigo neste mesmo dia
no ano passado, ou em outras épocas. Tenho a certeza de que Já fui tocado
muitas vezes, de alguma maneira, pela beleza do céu azul de outros outonos. Eu
reconheço a sensação, porque toda sensação marcante se transforma em
sentimento. Não é algo novo, somente um sentimento atualizado. Por assim dizer,
o sentimento é sempre um reconhecimento de época.
Mesmo que eu não saiba
o porquê, sei o como. Existe algo no meu corpo a se mobilizar nos dias de
outono. Fatos salpicaram a minha história, formaram relevo, criaram sulcos.
Todos os anos sinto o sentimento se transformar na mesma emoção, um fluxo de
movimento a me surpreender. Nunca deixei de sentir esse dinamismo em minha
carne, mesmo sem conceber um significado.
A memória é algo a nos
deixar perplexos. Nem sempre conseguimos interpretar o que nos mobiliza. Isso é
sentir sem razão. Esse é o verdadeiro emocionar-se. Creio que a razão é uma
tentativa de descoberta, e quando não sabemos dizer o que é, acabamos por inventar
uma justificativa para a nossa história passada. Isso se torna um roteiro sem
rumo. Será que precisamos destrinchar tantas coisas? Acreditamos que analisar
nos fomenta segurança. Como é difícil afinar a corda do "deixar ir",
não?. Somos educados a entender tudo. Queremos saber das coisas e
categorizá-las. Isso é importante até certo ponto, porque também é necessário
tirar férias do centro de comando, fluir ao desconhecido de nós mesmos, sem
dizer nada. A linguagem é construída de modo linear, a razão sabe como
proceder. A emoção, ao contrário, é deflagrada sem palavras, sem rumo
certo.
Da emoção nasce o
sentimento, uma espécie cognitiva da expressão do corpo. Vivemos uma época em
que sentir sem controle se tornou ameaça. Queremos entender o que se passa em
nós. Frequentemente, em meus atendimentos, as pessoas me perguntam por que
experimentaram tal sentimento ao se movimentarem em uma direção ou quando foram
tocadas em determinadas partes do corpo. Costumo dizer que ao mexer na bacia a
água fica turva. Tudo ficará tranquilo novamente, pois a água voltará a se
acalmar.
Atualmente, as pessoas
acham que tem de existir razão para tudo. A emoção fica à deriva, num canto
mudo cujo processo continua a brotar incessantemente. Daí as pessoas quererem
dar vazão à emoção artificial, para se sentirem vivas. O corpo busca se expressar,
independentemente de nossa vontade consciente. Elas buscam se emocionar por
nada. Se você abrir o Facebook encontrará frases que não dizem nada. Não é
para menos, as frases são sem brilho, não podem tocar verdadeiramente.
As pessoas buscam em
filmes, novelas, livros, até mesmo nos noticiários, algo que possa tocá-las,
fazê-las vivas. Então, o corpo aprende a sentir pelos dramas, dos outros, e não
mais através de sentimentos das profundezas do self. Nada pode nos fornecer emoção
viva senão por nós mesmos. A emoção viva só nasce na contração e relaxação (sem
pausa) dos músculos.
Emocionar-se ao
encontrar o belo; uma simples flor amarela, uma brisa fria no fim da tarde, a
luz tímida da lua crescente, o orvalho da manhã repousado nas folhas verdes.
Isso é simples. O que nos emociona verdadeiramente também cria novos espaços de
beleza dentro de nós.
Você já pensou o que o
toca sem o sentir da razão?
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