20 de agosto de 2012

A motivação não se encontra do lado de fora




O dia amanheceu com sol e céu brilhantes. Clima manso para novas experiências. Nunca repetimos experiências, mesmo que a consciência possa dizer ao contrário. Vivemos sim reconhecendo situações. A memória nos facilita saber que algo é conhecido, mas em tudo há mudança. Agora mesmo, estou escrevendo aqui e me sentindo repetitivo. Mas, tenho a convicção de que algo está diferente. Não sei bem o quê. O computador é o mesmo, o céu é o mesmo, o sol já é conhecido, a cadeira está no mesmo lugar. Bem, a música é nova. Sim, existe algo diferente para a minha consciência. Estou escutando Julia Stone. Nunca a ouvi. Ela é uma cantora australiana de voz mansa e rascante. Estou gostando. Isso é novo para mim, mas a sensação de estar ouvindo algo que desconheço também se torna, em um contexto maior, algo semelhante ao que já ouvi antes. Esse é o hábito das preferências. Nossas preferências também tem um quê de busca de reconhecimento em nós mesmos. Não conseguimos escapar de nós mesmos. Cada pedaço da experiência é uma peça do quebra-cabeça procurando encaixe em algo conhecido. É por isso que mudar só se faz com esforço.

O meu dia começou lento, sem animação. Parece que a minha alma ficou em algum lugar, perdida lá trás, no sonho da madrugada. Poderia dar uma justificativa, como já fiz ao acordar. O motivo de me sentir assim é por causa da segunda-feira. Gostamos de achar explicações, mesmo injustificáveis.

Tenho de me reanimar, como o monstro Frankenstein ao levar um choque. O céu está limpo sem previsão de relâmpagos. Então, não posso esperar nada de fora. Tenho de me transformar por dentro. Eu conheço um modo de me sentir mais apto – não quer dizer mais animado. Eu mesmo tomarei o choque da responsabilidade. Hoje tenho de trabalhar. 

É muito ruim ter de viver em segundo plano. Quando não estamos nos sentindo motivados e animados, criamos um automatismo. Ligamos o piloto automático a fim de conduzir a aeronave em rota programada. O importante é o compromisso! Essa é a regra do “fazer”. Oxalá pudesse colocar as minhas responsabilidades em suspenso! Mas, tenho sido covarde em fazê-lo. Quando era mais jovem fazia sem remorsos, porque não havia motivos para culpas. Atualmente, sou mais inflexível com os meus compromissos. Porventura seja pela mudança em decorrência do envelhecimento. Mesmo quando consigo, raramente, não deixo de me sentir entediado. Viver é uma ambiguidade sem fim.

Tenho me resignado ultimamente. Se me perguntam sobre os meus novos projetos, costumo dizer que não há ambição no momento, só ação presente. Sei que é perigoso se resignar com o presente. Só devemos nos resignar com o passado, pois este não tem volta, só existe poeira de ilusão. Talvez seja essa a minha teoria do desânimo. O que me anima é saber que tudo é passagem. Não há como ficar na mesma posição. Podemos estar situados, mesmo assim estão ocorrendo mudanças. Não há paragem, só continuação. Para me sentir melhor procuro não dar sentido de valor para o momento. Se a situação está boa ou má, não interessa. O importante agora é sentir, não racionalizar. É um perigo para o bem-estar querer achar justificativas. 

O cérebro humano detesta lacunas. Ele busca sempre um pretexto para o comportamento. Quando nos sentimos mal, o cérebro procura explicação. Ele vai longe. Adora ir principalmente à infância, tenta culpar alguém, fantasia outros modos de viver. Daí aparece o pensamento “Se e Então”. “Se eu tivesse estudado em bons colégios, então teria um emprego melhor”; “Se eu fosse mais rico, então teria menos preocupações”; “Se eu tivesse nascido em outra família, então não teria tantos problemas”.

Temos de tomar cuidado com o “Se e Então”. São armadilhas de nosso cérebro. Quando ele encontra um pedaço do quebra-cabeça, mesmo que não tenha nada a ver, pronto, ele constrói a teoria do mal-estar. Vivemos o que construímos, seja bom ou ruim. Não podemos dar asas de cera para a imaginação. Toda escolha é um risco. Se o momento não está bom, podemos criar algo novo, pois tudo se renova aqui e agora. O novo nem sempre é fazer algo diferente. O novo é também estar em espera harmoniosa, sem expectativas.  

Hoje eu decido construir um novo cenário para mim. O dia está lindo e me banharei na brisa suave. Mesmo que algumas nuvens possam afastar essa certeza, terei a convicção de que estarei melhor à tarde. Quando a noite chegar, comemorarei a passagem, farei do meu dia uma verdadeira Páscoa, um momento de ressurreição.    
     

 

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