30 de agosto de 2012

Questionar para se libertar



Obviamente é mais fácil seguir as regras sociais do que questioná-las. Todo questionamento é uma provocação, um abrupto modo de desviar-se do conhecido, sair da zona de segurança. Questionar é um risco. Entretanto, sem questionar nos tornamos autômatos. É uma escolha. Por exemplo, muitas pessoas acham que viver bem é não ter de passar por adversidades, enquanto viver mal é atravessar um rio caudaloso de perpétuo sofrimento. Nenhuma vida é fácil. Pelo menos, até agora, nunca encontrei uma pessoa, que seja reflexiva, obviamente, afirmar que a vida é fácil. Todos nós temos de aprender, e isso se faz pela passagem de um estado a outro. Sendo assim, aprender é mudar. Mudar é ter um novo modo de perceber as situações e circunstâncias já conhecidas. Nunca saímos incólume de um novo modo de ver as coisas. Dá trabalho e exige esforço de adaptação. É como a borboleta que não acha graça alguma ao sair do casulo. Ela tem a liberdade de voar para onde quiser, mas o casulo a propicia mais conforto e segurança.
 
As pessoas querem o novo sem abrir mão do antigo. Há duas semanas estive com alguns religiosos, mas não tão crentes assim. Uma coisa é a escritura, outra coisa é a atitude e a emoção expressadas. Costumo pensar que quem tem fé não teme o que ainda não está à frente, certo? Pode parecer óbvio, mas não é bem assim. Todos nós durante a vida passamos pelo medo e preocupação. São coisas diferentes. O medo é um sentimento a provocar uma emoção (reação corporal) no intuito de lutar ou fugir com a finalidade de autopreservação. A preocupação, no entanto, é uma lucubração, devaneio de um possível revés na vida. Ambos provocam grandes mudanças corporais que, se mantidas por muito tempo, passarão a ser uma catástrofe ao equilíbrio do organismo.

Ter medo é fundamental. Ele surge em situações de risco verdadeiro. Preocupação, por outro lado, é se ocupar antes de o acontecimento surgir. Então, ter medo não depende da fé. Ele surge independentemente da vontade consciente. William James teorizava que primeiro fugimos (ato inconsciente) para depois sentirmos medo (ato consciente).    
   
Segundo o Dicionário de Filosofia – eu tive de recorrer a ele para corroborar minha ideia –, Fé é uma espécie de confiança religiosa na palavra revelada pela divindade. Enquanto a crença, em geral, é o compromisso com uma noção qualquer. São Paulo dizia: “Fé é a garantia das coisas esperadas e a prova das que não se veem”. Ou seja, a ciência prova o que se vê, enquanto a fé não prova, e nem precisa provar nada. A fé é um diálogo com o obscuro.

José Maria Cabodevilla, sacerdote e teólogo espanhol, dizia que Deus não gosta dos insones. Ele se referia às pessoas preocupadas, porquanto sem fé. É nesse sentido que penso na importância de questionar os conceitos para aprendermos outras formas de viver. Eu não posso ser um homem de fé enquanto me preocupar com o meu destino. Só terei fé quando confiar no fluxo divino da natureza.
Sócrates ao dizer “Eu sei que nada sei”, queria provocar seus interlocutores e também a ele mesmo, queria pôr em dúvida as certezas. Ser cético não é ser uma pessoa incoerente, chata, mas é ter uma saída para rever os próprios conceitos.

Não temos como saber quem somos totalmente. Por isso temos de questionar tudo, inclusive nós, sem julgar, culpar ou punir. Se a mudança é irredimível não tem como sermos os mesmos do passado. Podemos ser melhores. Assim sendo, exercitaremos o nosso livre olhar sobre as coisas, sem perder a atenção no observador, que somos nós mesmos. Enfim, nós ainda continuaremos a ser a pessoa mais importante do cenário planetário. Pois, quando fecharmos as janelas da alma mais nada importará.

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