23 de abril de 2011

Atendimento bom pra cachorro (2)



Caminhava pela rua às oito da manhã. Ao atravessar a praça principal da cidade vi um mendigo com um cachorro velho dentro de um carrinho de supermercado. Ele estava a lavar o bicho, passava uma esponja no pescoço com carinho enquanto cantava para ele. Quis filmá-lo para colocar no blog, mas não gosto de interferir no cotidiano das pessoas com aparelhos. O meu recurso é a palavra.
O mendigo estava muito sujo, ninguém havia se prontificado a cuidar dele. Continuei a pensar por que as pessoas, mesmo as mais perturbadas, se preocupavam com os bichos abandonados. Por que as pessoas se comovem mais com o animal não humano do que com o animal humano? Seria a posição terna da cabeça do bicho? Seria o gesto de balançar o rabo? Seria o olhar de afeto que afeta? Seria a condição de nada exigir? Qual a força de atração?
Continuei a minha caminhada e logo passei perto de uma casa de repouso, e na varanda da casa uma velha mulher sentada olhava para o chão, sozinha, esperando nada acontecer. Um velho que quiser tomar um banho tem de pagar pelo trabalho, enquanto os cachorros de rua são cuidados pelos sem tetos.
O que um velho em uma casa de repouso precisa? O mesmo que todos nós precisamos; a comunhão do alimento afetivo.
Estamos na Páscoa, boa época para se pensar menos em ovo de chocolate e mais no sabor doce da doação. É simples, tente uma palavra de elogio, ou mesmo carinho em gesto como o mendigo que canta enquanto lava o pescoço do cachorro velho. Será que conseguimos sair de nosso sofá e ir até o outro para dar um pouco de nosso doce? Só faremos isso se conseguirmos ter algo doce dentro de nós. Ninguém pode amar se não tem o que doar. 

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