Às pressas, uma das filhas da Sra. Alcinda empurrou a cadeira de rodas e a colocou de frente para o padre. Lá a deixou sozinha. Alcinda não conhecia ninguém naquele lugar. Não era cerimonia de família. Ela só tinha ido ao casamento porque não havia ninguém para ficar com ela em casa. Era sábado, e todos tinham seus compromissos.
A cerimonia comum, nada especial. Ali sozinha, a mulher de 95 anos ficava a lembrar de seu próprio enlace que não dera certo.
Não se sentia à vontade. O ambiente estava repleto de perfumes misturados, maquiagem espalhadas pela multidão, várias roupas novas para um grande dia sem graça. De repente, uma incômoda coriza começou a brotar, e Alcinda procurou o lenço. Nunca o abandonara. Sempre o levava com ela para as horas de necessidade.
Não o encontrava. Depois de muito procurar na manga da blusa e no sutiã, descobriu que a filha tinha levado sua bolsa. Estava certa que o lenço tinha ficado lá. Como ela limparia o líquido a escorrer? Ela estava de frente com o padre, não podia perder a educação. Mas não tinha solução. Abaixou a cabeça, e antes de o excesso de líquido pingar, usou os dedos para secar o nariz.
Agora era os dedos que estavam molhados. Não podia sujar o vestido vermelho com lantejoulas prateadas. Esperou secar. Não conseguia prestar atenção à cerimonia. "Também, hoje em dia, ninguém costuma prestar atenção às palavras dos padres", justificou-se.
A cerimonia terminou, e ela continuava ali esperando alguém para buscá-la. Todos saiam em clima de festa, mas ela permanecia ali. O padre já tinha abandonado o altar. Quando ela percebeu a igreja estava vazia. Com dificuldade tentou se virar na cadeira para pedir a alguém para pegá-la. Não tinha mais ninguém. Todos estavam com fome e sede.
Enquanto o tempo passava, ela lembrou de uma frase que havia escutado há anos: "velho é que nem guarda-chuva, sempre esquecido". Ficou magoada. Porque agora sabia que era velha, e ninguém reconhecia o seu sentimento de abandono. Ela quis chorar, achou inconveniente, tinha de ser forte.
Muito tempo depois sua filha apareceu com um sorriso discreto no rosto, sabia que tinha esquecido a mãe. Nenhuma palavra. Ela não quis reclamar, podia ficar pior.
Chegando à recepção o genro, para quebrar o clima de decepção, falou em tom jocoso: "Esqueceram a senhora. Quase não sobra comida". Ela nada disse. Bebeu guaraná sem ter sede e comeu uma coxinha de galinha sem ter fome.
Não disse uma palavra durante toda a noite. Não tinha com quem reclamar. Mesmo se quisesse ninguém a via. Só o que as pessoas viam era uma cadeira de rodas, fácil de manusear.
O único alívio era ter novamente o lenço para secar sua coriza de tristeza.
Não disse uma palavra durante toda a noite. Não tinha com quem reclamar. Mesmo se quisesse ninguém a via. Só o que as pessoas viam era uma cadeira de rodas, fácil de manusear.
O único alívio era ter novamente o lenço para secar sua coriza de tristeza.
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