11 de fevereiro de 2013

Uma imagem criada, um mundo construído.








Bem próximo de mim havia uma linda mulher vestida de branco. Com ar de pureza ela se rejubilava por sua beleza, tudo seria perfeito se não fosse a barra do vestido sujo de lama. Sempre haverá sujeira onde menos se espera encontrar. O que está mais perto da terra está sujeito a se sujar. Ser humano implica essa faculdade. Não sabia ao certo o que ela fazia ali. Estava em meus olhos apenas. Ela parecia recitar um soneto, porque assim eu queria. Às vezes, procuramos poesia para viver mais leve. Ela estava em mim e não aos meus olhos apenas, tocava os meus sentidos. Ela queria se comunicar porque eu precisava disso. Estava cansado de minha solidão. Ela não podia estar fora, estava dentro, me fazendo questionar o meu próprio querer. Se o que está fora é o que eu vejo, então não podia estar longe de mim. Tinha essa certeza. Ela não representava o outro, senão eu mesmo. É nessa solidão na qual vivo que me possibilita saber mais sobre mim mesmo. Bem, desconhecer também é um fato, pois para algumas pessoas conhecer não faz muita diferença.

Sabia que ela era construção de minha mente, só eu poderia ver o que queria ver. Nada pode ser construído sem que exista algo em nós para se desenrolar. Isso é o que a mente faz sem cessar. A mente não suporta lacunas. Os espaços em branco são logo preenchidos por uma cena. Até mesmo de olhos fechados possuímos imagens. É difícil conter o fluxo das imagens mentais. Mesmo a meditação vem acompanhada de imagens. Sempre me pergunto se na prática da meditação existe em algum lugar, não consciente, é claro, uma cena a se mover. Acho que temos tantos compartimentos dentro de nós que existe sim um movimento, mesmo no silêncio mental.

Duas horas da tarde e eu ainda não tinha almoçado. Não gosto de passar da minha hora do almoço. Era preciso comer algo, já estava ficando lento. Sinto-me assim, lento como um jabuti quando falta açúcar no meu sangue. Mas, a comida não estava pronta.

A comida foi servida e eu fiz o meu prato. Nada de diferente dos outros dias. A comida era igual, pois era feita pela mesma pessoa de sempre. O bom tempero só se conhece quando temos algo para comparar. Aliás, buscamos a comparação em tudo. Assim, fica mais fácil perceber o que era o antes e o depois, para aprender o novo. Mas, o que é o novo senão uma repetição? Sempre tive essa pergunta em mente. Como podemos aprender algo novo se só conhecemos a experiência pelos códigos já registrados? Isso significa que vivemos em círculos. O que escrevo agora é somente uma repetição de muitas palavras que já pude experimentar. Sair de mim para construir algo totalmente novo é "quase" impossível. Ninguém imagina que viver uma nova experiência é somente reviver num sentido já vivido. Isso eu chamo de padrões. Eles já existem em nós, por assim dizer, vividos no passado, buscando saída para viver novamente. É o caso de você conhecer uma nova pessoa e ela ser parecida em alguns aspectos com você mesmo. Ela não é uma nova pessoa, mas uma já conhecida por você. Ou seja, ela é um reconhecimento. É difícil sair de cena do conhecido, principalmente quando você já está mais velho com tantas experiências acumuladas. Estou certo de que na velhice fica mais fácil repetir.

Como experimentar algo que está totalmente longe de nossa própria experiência de vida? Muitas vezes me pergunto o que preciso fazer para transgredir os meus padrões aprendidos. Não sei, pois não gosto de abrir mão de minha zona de conforto. Já tentei várias vezes, mesmo assim sempre que tentei sair, para estar em novas cenas, estive com pensamentos semelhantes aos de sempre. Não adianta muito mudar o espaço, carrego comigo a mim mesmo.
  
Sempre penso que a velhice poderá sanar a minha busca, mas temo ficar sem procurar, o que é também ruim. É preciso ter direção. Sem rumo nada faz sentido, ficar estagnado não é produtivo.

Daqui a pouco faço aniversário, mais um ano de vida, e me incomodo de pensar que nada será diferente, porque os meus Natais não foram diferentes, muito menos os meus carnavais. É a repetição que me torna aprendiz de mim mesmo. Acho que tenho de ler e reler a minha história. Essa, porventura, seja uma saída. Quando menos eu esperar eu serei outro além de mim mesmo.

Indubitavelmente acredito na mudança, porque se não fosse assim não envelheceria. Envelhecer é uma prova de que mudo, quer eu queira quer não. Não há com o que me preocupar. Até mesmo porque a preocupação é negativa, porque se fosse positiva seria sonho.

Não duvido de que a vida nos leve a lugares totalmente diferenciados quando precisamos retomar a nossa direção, não escolhida por nós. Acredito nisso porque há em nós algo latente, em busca de novas trajetórias, novos começos, porque é preciso evoluir. Na evolução o novo não pode ser apenas uma releitura de nosso passado.

Então, fico feliz, abre em mim uma esperança e até confiança. É só aguardar, fazer o que é para ser feito, e deixar o mundo girar.

Ao estarmos mais velhos os anseios mudam de perspectivas. É impressionante como somos diferentes em termos de visão e valores, menos de sonhos. Nunca abandonamos os nossos sonhos, mesmo que eles por diversas vezes se tornem frustrações. Eles sempre estarão lá.

A caminho de casa todos encontrarão o porquê. Gosto de pensar assim, mas tenho receio de não ser uma verdade. Nunca saberemos. Acho que é assim que todos nós queremos que seja. Muitos conseguem chegar nesse nível. Já vi muitas pessoas plenas no fim da vida, mas já vi também muitos reclamarem que ainda precisam de tempo para realizar seus sonhos. O tempo não é nosso. Só temos um tempo que é o agora. Se puder ser agora, pronto, está feito.

Acho incrível a mente humana, ela está sempre a criar. O real se mostra como queremos ver. Não é ficção, é realidade mesmo. Sem dúvida, que a realidade é bastante incerta. Somos também a dúvida, por isso nascemos num mundo de dualidade. Se fosse diferente seríamos todos felizes, mas não somos. Porque somos incompletos. Ser incompleto é condição humana. Isso nos faz andar sempre em sentido anterior.

A vida nos mostra o caminho, mas, de uma forma silenciosa e inconsciente, somos nós que pintamos o cenário. É por isso que acredito em mundos paralelos. Vivenciamos coisa das quais não conseguimos entender como, muito menos o porquê.

Existe em nós uma inteligência que nos leva a algum lugar. Esse lugar pode ser bom ou ruim, não importa, pois a inteligência não valora, ela manifesta. Tudo o que vivemos nasceu antes em nós, de um modo pouco compreensível. É como um projeto de uma casa. Ninguém sabe como a casa ficará ao estar pronta, mas ela nasceu de um projeto, de uma ideia. Temos também as nossas ideias a respeito do que queremos viver, mas não sabemos como realizar. Por isso, buscamos. Nem sempre as coisas acontecem como planejamos. Porque o realizador não tem a mesma competência do idealizador. Temos os dois dentro de nós. Podemos idealizar, mas nem sempre conseguimos realizar, manifestar no mundo nossas ideias. 

Tudo nasce de um ponto. Algumas vezes, o ponto foi criado muito cedo em nós. Não me canso de ver pessoas que vivem uma vida de angústia e sonhos irrealizados. Não porque elas sejam incompetentes, pelo contrário, elas têm todos os recursos para serem as melhores realizadoras no mundo. Entretanto, algo surge e desmorona os seus castelos de areia. Elas não conseguem entender, porque não podem entender. Fomos abarrotados com os conceitos da autoajuda, que não funciona para todos. Por que isso? Porque não estamos preparados para ter o mundo como idealizamos. Como disse antes, somos bons idealizadores, mas nem sempre realizadores competentes. Para ser competente é necessário disciplina e dedicação. Sem elas é difícil mudar o cenário da vida.

Conheço também muitas pessoas que não fazem nada e conseguem realizar. Realizar não significa estar preparado para a realização. Bem, é preciso saber o que é o melhor. Nem sempre o melhor para você é o melhor para o outro. Mesmo que você consiga um carro novo, uma linda casa, uma família feliz (slogan de margarina), isso não significa que seja o melhor para você. É preciso saber quem cria e ser um bom condutor do cenário criado. Conheço pessoas que possuem muitas coisas, mas não sabem o que fazer com elas. A terceira problemática aparece: Como conduzir o que se realiza?

Todos nós precisamos saber como conduzir a nossa vida. Sem condução não há satisfação. Muitos idealizaram, conseguiram realizar, mas não sabem o que fazer com isso. É como correr na praia com as mãos cheias de areia para construir o castelo. Ao se aproximar dele verifica-se que ele já está pronto, não sabendo o que fazer com a areia que sobra nas mãos. Muitos se irritam e jogam fora o que conseguiram, e, não raro, acabam por destruir o próprio castelo, perdendo tudo.

Conduzir a vida a partir daquilo que se construiu é uma tarefa difícil. Muitos querem mais, sem saberem o que fazer com o que tem. Essas pessoas estão viciadas em obter mais, se desgastaram na conquista, porque a construção foi “forçada”. Tudo o que é feito com esforço cansa. Quantas pessoas conseguiram grandes feitos para no final deixar tudo nas mãos dos outros, ou mesmo sofreram intempéries e não conseguiram desfrutar do que se construiu.

Para ser um bom condutor é preciso sabedoria. Isso é difícil porque não sabemos muito bem como encontrá-la. Eu ainda creio que a sabedoria só pode ser alcançada, quando possível, pela observação e reflexão. É preciso atenção em nós mesmos, tudo o que se passa conosco. Se não for assim, podemos colocar tudo a perder.

Atualmente é o que mais assistimos. As pessoas acreditam numa fórmula mágica de realização, mas isso não existe. Sempre digo e repito, não construímos nada sozinhos, somos cocriadores de nós mesmos. Porque não vivemos isolados. Fomos criados por outros e criamos esses mesmos outros. Fazemos isso o tempo todo, muitas vezes não de modo consciente. Essa é uma questão básica. Temos a petulância de achar que somos suficientes em tudo que ocorre conosco. A consciência é somente uma pequena parte do processo. Existem muitas lembranças guardadas que ditam regras, pelas quais não conseguimos escapar.

Mesmo que entendamos, quando menos esperamos, pronto, repetimos o padrão. Tomamos a decisão de outrora e não dá certo. Ficamos cansados de tanto repetir, de tanto buscar novas tentativas. E quando pensamos que já conseguimos tudo, o mundo nos sacode, nos mostra que as coisas não são bem assim. Não podemos esquecer que o mundo é somente um reflexo de nós mesmos. Não lograremos entendê-lo totalmente. Ele só nos mostra aquilo que somos, ou seja, um novo reconhecimento. Tudo está somente dentro de nós.

Enfim, temos de ter cuidado com aquilo que desejamos.

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