Semana passada ministrei uma palestra sobre “O envolvimento
da família com a doença”. Gostaria de compartilhar aqui o resumo de minha exposição.
Entendo a família como um complexo cujos membros estão
relacionados entre si. A família é como um móbile, uma vez que uma parte se
mova as outras acompanharão o ritmo do movimento. Porque tudo está interligado
e é interdependente. A família é definida pelo relacionamento entre as partes,
em vez de pela soma das partes. Cada membro familiar é um hólon, isto é, uma
totalidade indivisível. Portanto, a importância de se respeitar as diferenças.
Nesse sentido, a família pode ser entendida como um organismo vivo complexo,
com um sistema autorregulador a fim de preservar a homeodinâmica do sistema.
Sempre que uma parte do sistema familiar estiver fora de equilíbrio, os outros
membros do sistema tentarão equilibrá-lo.
Não existe equilíbrio estático, como muitos podem querer
acreditar. Vivemos porque somos seres em movimento. A homeodinâmica é definida
como um processo autorregulador que mantém o equilíbrio dinâmico, transacional,
de um organismo. Quando sofre qualquer perturbação, os laços de
retroalimentação operam a fim de reduzir ou ampliar qualquer desvio do estado
de equilíbrio. Por isso, aprendi que viver é um constante pintar cenários,
arrumar gavetas e caminhar no incerto.
A família constitui a unidade primária e estrutura nuclear
do padrão social. Sendo assim, estar em relação é estar em ação, mudando a todo
momento. E se tudo muda, não há como afirmar que podemos conhecer os filhos, os
pais, ou qualquer pessoa. O que somos hoje não seremos assim tão semelhantes amanhã. Essa premissa nos ajuda a ser mais tolerantes e com menos
expectativas. Com menos expectativas, mais chances de não nos frustrarmos.
Na palestra, foi abordado sobre a importância de entender que
as palavras doença e saúde são singulares, porque se referem
ao estado da pessoa em si, e não as partes do corpo ou órgãos. O mal-estar é
estar mal no corpo, é estar fragmentado. Foi mostrado que durante a vida, as
pessoas envelhecem e se fragmentam, principalmente ao resistirem ao fluxo
natural da vida.
Ao longo da vida vamos nos fragmentando, seja pelas perdas,
frustrações, preocupações, conflitos relacionais, seja pela incapacidade de
aceitar o que se mostra como desafio. Viver é ser desafiado constantemente.
Tudo depende de como encaramos os acontecimentos. Uma realidade é realidade
para um único olhar.
Mesmo depois da fragmentação ainda existe a capacidade de
resiliência, um resgate do equilíbrio coletivo.
Como as pessoas se fragmentam? Pela alteração do fluxo da
bioenergia. Alguns comportamentos como o controle, a preocupação, o conflito
relacional, são evidentes em processos de fragmentação. Esses comportamentos
bloqueiam a espontaneidade da vida. Citando mestre Eckhart: “Deus é a unidade e
a pureza, e estas decorrem do desprendimento”.
O controle é rolar contra o fluxo natural da vida, é a resistência, e,
portanto, sofrimento.
Para esclarecer sobre um pensamento recorrente equivocado, o
qual as pessoas ainda insistem acreditar, foi mostrado que a velhice não é
sinônimo de doença. O sistema biológico se torna mais vulnerável nessa fase da
vida porque a vulnerabilidade não é somente física, e sim também psicossocial.
Qual o maior temor da velhice? A dependência. Segundo
pesquisas sobre o cuidado a situação é alarmante e
preocupante, pois as famílias não estão organizadas o suficiente para função
tão estressante. O estresse é propiciador de atitudes como raiva e culpa; impaciência
e intolerância; acusações e agressividade; negligência e maltrato.
Todavia, o ato de cuidar de um familiar doente é uma
oportunidade de resgate. Toda relação familiar é um convite a resgatar algo que
se perdeu no tempo, porque os mais velhos são oportunidades para os mais novos
reverem suas próprias histórias. E se o afeto é o que nos afeta, ele é um meio
de transformar o que se foi um dia em algo maior, aqui no presente. Para isso,
é necessário transcender o ego, o que não significa destruir o ego, mas sim,
conectá-lo a alguma coisa maior.
A palestra foi finalizada mostrando que a espécie humana é
dotada de um cérebro mais evoluído do que as outras espécies. Sendo assim, o
humano tem a capacidade de consciência para refletir sobre suas próprias atitudes
e escolher a paz e harmonia nas relações familiares. Reforçando que a
consciência e o olhar atento ainda são a melhor saída para todos os conflitos
familiares.
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