9 de setembro de 2013

O que eu posso aprender com a vida dos outros?





Eu sempre acreditei que atender a pessoas mais velhas seria uma oportunidade inestimável, um constante ganho de experiências. Ainda continuo a pensar assim. O que mais me fascina é conhecer pessoas que conseguiram passar por situações difíceis, e mesmo assim continuarem. Acho fascinante presenciar essas histórias. Fico comovido porque eu sei que não tenho tanta coragem assim. Quando temos uma identificação com algo ou alguém é pelo fato de termos algo em comum, seja positivo ou negativo. Apesar de ter vivenciado muitas histórias, ainda sou imaturo com relação à vida. Eu me emociono com a coragem de viver de algumas pessoas. Eu não poderia ter um merecimento maior do que ser terapeuta de pessoas mais velhas que eu. 

Hoje foi descoberto um tumor no cérebro de uma de minhas personagens. Essa mulher já passou por diversas agruras na vida, e ela continua altiva e com fé. Tive a oportunidade de testemunhar não só um milagre, mas muitos, durante a nossa vivência terapêutica. As pessoas acreditam que milagre vem de fora, do auxílio de um ser divino que se encontra na nuvem mais próxima. Muitos acreditam que Deus está lá, a fim de ouvir as nossas lamentações infantis.  Ela me ensinou que não é bem assim. Hoje à tarde, após a notícia do tumor, pensei que se eu pudesse falar no funeral dela, eu diria: 
"Esta mulher foi a personificação da fé. Já atendi a padres, pastores, monges, freiras, mas nunca uma pessoa de verdadeira fé como ela". 

Muitos vivem bem, outros não tão bem. Mas só quem pode dar valor ao que se vive é a própria pessoa. Ninguém pode dizer o que é bom ou ruim para o outro. Existe uma expressão usada por muitos que me incomoda: "Você tem uma vida boa. Tem muita gente que sofre mais do que você". Ninguém pode vestir a pele do outro. Cada história é uma história intransferível.
                                                                                                                         
O legado de cada história que eu ouço só corrobora uma ideia: no final tudo sempre acaba bem. Isso me tranquiliza de alguma maneira. Já refleti se isso não é uma justificativa, pois somos sempre cheios delas. Mas, até hoje ainda consigo lograr uma hermenêutica plausível para a vida de quem eu trato.  Pode-se pensar que a morte é algo sem solução, mas o que eu aprendi é que a morte também tem uma lição implícita, aprenda quem puder. Todos conseguem se adaptar à morte. Se não for agora, será depois. Quando alguém diz que nunca conseguiu superar a morte de alguém, eu sei que isso é apenas uma justificativa para a pessoa estar num lugar de sofrimento e ganhos secundários. Escolhemos o lugar onde queremos estar. Tudo tem o seu porquê, basta refletir para alcançar uma compreensão.

As pessoas mais velhas são vencedoras. Uma vez disse isso a uma pessoa que atendo e ela retrucou: "Como posso ser vencedora se não acabou ainda?". Essa resposta me fez refletir, porém eu ainda acho que nós somos vencedores de um jeito ou de outro. Porque se a situação pela qual passamos foi difícil e ainda assim continuamos é porque vencemos. Não julgo, mas não deixo de achar que o suicídio é uma forma de covardia. 

Bem, eu percebo que eu envelheço muito rápido, porque os dias são efêmeros como nunca. Hoje já não sou tão jovem e ativo como no passado. Já consigo enxergar os mais jovens e suas inconsequentes escolhas. Tento entendê-las, pois já fui assim. Envelhecer nos dá um retrovisor com maior visibilidade. Hoje, conheço velhos com inveja dos mais jovens e outros condescendentes consigo mesmos. Eu não sou nem uma coisa nem outra. Eu ainda consigo relativizar os planos de existência, só não sei até quando.

Viver é estar constantemente se surpreendendo. Quem acha que sabe o que é certo está prestes a errar. Nunca vi tanta gente equivocada com relação a si mesma. E se vejo assim tenho de ter cautela comigo mesmo, porque o erro me habita sem que eu saiba. Todo cuidado é pouco com as minhas certezas. Por isso, a humildade do pensar é fundamental. Entretanto, eu não acredito também em minha total humildade. Sou muitos em um só. O meu ego se transveste de várias roupagens. O que eu sei é que as responsabilidades geram esforço. A vida provoca fragmentação. Portanto, o mais importante é conhecer as minhas limitações. Apesar de as pessoas mais velhas reforçarem a minha eterna juventude, eu sei que já não sou tão jovem como consigo me sentir e nem tampouco sou o velho como as pessoas não querem me ver. Isso ainda não é um problema para mim, mas até quando? Penso muito na minha velhice. Sei que as surpresas ocorrem, e preciso estar atento, sem me perder de vista.


A vida é um processo caótico em busca de uma organização. Tudo está certo. A história de vida de cada um é rascunhada e imiscuída por tantas situações que eu não posso me diluir nelas.


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